A Comissão de Relações Exteriores (CRE) do Senado Federal realiza, na quinta-feira (24), audiência pública interativa para debater o posicionamento do Brasil nas negociações do Tratado Global de Combate à Poluição por Plásticos. Proposta pelo senador Esperidião Amin (PP-SC), a iniciativa reflete a urgência de enfrentar um dos maiores desafios ambientais da atualidade: a poluição por plásticos, que ameaça ecossistemas, a saúde humana e a economia global. Com 15 milhões de toneladas de plástico despejadas nos oceanos anualmente – o equivalente a dois caminhões de lixo por minuto –, o Brasil, responsável por cerca de 325 mil toneladas desse total, busca alinhar-se às metas internacionais para mitigar esse impacto.
Aprovada em março de 2022, durante a 5ª Assembleia da ONU para o Meio Ambiente (Unea-5), a Resolução 5/14, ratificada por 175 países, incluindo o Brasil, estabeleceu o Comitê Intergovernamental de Negociação (INC) com o objetivo de elaborar um tratado juridicamente vinculativo até o final de 2024. Sob a coordenação do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), as negociações avançam para abordar o ciclo de vida do plástico, desde a produção até o descarte, promovendo uma economia circular e soluções inovadoras.

Impactos Ambientais: Uma Crise Global e Local
A poluição por plásticos é uma crise que transcende fronteiras, afetando ecossistemas marinhos, terrestres e a saúde humana. Globalmente, 46% dos resíduos plásticos são depositados em aterros, enquanto 22% são mal geridos, transformando-se em lixo que polui rios, solos e oceanos. No Brasil, a situação é agravada pela gestão inadequada de resíduos, com 325 mil toneladas de plásticos chegando aos mares anualmente, impactando a biodiversidade e a segurança alimentar. Microplásticos, partículas inferiores a 5 mm, já foram encontrados em órgãos humanos, como placenta, pulmões e corrente sanguínea, levantando preocupações sobre efeitos de longo prazo ainda desconhecidos.
No contexto brasileiro, a poluição plástica ameaça biomas como a Amazônia, o Pantanal e o litoral, comprometendo a fauna marinha e a qualidade das águas. “A poluição por plásticos não é apenas um problema ambiental, mas uma questão de saúde pública e justiça social,” destacou Ítalo Braga de Castro, pesquisador da Unifesp, um dos convidados confirmados para a audiência da CRE.
Inovação Tecnológica: Soluções para uma Economia Circular
A inovação tecnológica é um pilar central nas discussões do tratado, com foco em soluções que promovam a economia circular. O conceito busca reduzir o desperdício, incentivar a reutilização e reciclagem, e substituir plásticos de uso único por materiais biodegradáveis ou compostáveis. No Brasil, iniciativas como o uso de biopolímeros, desenvolvidos a partir de biomassa, ganham destaque. A Associação Brasileira de Biopolímeros Compostáveis e Compostagem (Abicom), que terá representantes na audiência, tem defendido a adoção de materiais sustentáveis que minimizem impactos ambientais.
Empresas brasileiras, como a Braskem, têm investido em “química verde”, utilizando matérias-primas renováveis, como o etanol de cana-de-açúcar, para produzir plásticos biodegradáveis. “O futuro da indústria plástica é a química verde. O Brasil tem vantagens competitivas, como vasta biomassa e terras férteis, mas a transição exige uma indústria forte e investimentos em inovação,” afirmou Adalberto Maluf, secretário nacional de Meio Ambiente Urbano do Ministério do Meio Ambiente.
Além disso, tecnologias como a reciclagem química, que transforma plásticos em moléculas reutilizáveis, e o ecodesign, que planeja embalagens para reduzir excessos, estão sendo exploradas. A impressão 3D também surge como uma solução inovadora, permitindo a criação de produtos personalizados que evitam embalagens desnecessárias. Essas tecnologias, aliadas a sensores inteligentes para otimizar o consumo de recursos, podem reduzir significativamente o desperdício.
A Coalizão Empresarial para um Tratado Global sobre Plásticos, coordenada pela Fundação Ellen MacArthur e pela WWF, reúne mais de 220 empresas globais, como Coca-Cola e Nestlé, que já adotam medidas para reduzir plásticos de uso único. No Brasil, a Coca-Cola implementou a garrafa PET universal, reutilizável após lavagem, evitando a produção de 1,8 bilhão de PETs na América Latina. Tais iniciativas demonstram o potencial da inovação para transformar a cadeia do plástico.

Perspectivas Futuras: Desafios e Oportunidades
As negociações do Tratado Global, que culminarão em dezembro de 2024 em Busan, na Coreia do Sul, enfrentam desafios complexos. Um dos principais entraves é a resistência de países produtores de petróleo, como China, Rússia e Estados Unidos, a metas específicas de redução da produção de plásticos. Enquanto a União Europeia defende a eliminação de plásticos problemáticos, como os de uso único, nações em desenvolvimento, incluindo o Brasil, demandam apoio financeiro e tecnológico para implementar as metas do tratado.
O Brasil, como um dos maiores produtores de plásticos da América Latina, tem a oportunidade de liderar a transição para uma economia circular. A Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), embora avançada, carece de diretrizes mais robustas para enfrentar a crise. Um manifesto assinado por 71 organizações da sociedade civil, incluindo Greenpeace e Oceana Brasil, cobra do governo brasileiro um compromisso mais ambicioso, considerando todo o ciclo de vida do plástico, desde a extração do petróleo até o descarte.
A audiência da CRE contará com especialistas como Paulo Teixeira, da Abiplast, e Severino Lima Júnior, da Aliança Internacional de Catadores de Materiais Recicláveis, que destacarão a importância de incluir os catadores na economia circular. No Brasil, esses trabalhadores são responsáveis por 90% da reciclagem, mas enfrentam condições precárias. “Integrar o setor informal é essencial para uma transição justa e inclusiva,” afirmou Lima Júnior.
O tratado também pode impulsionar investimentos em infraestrutura, como aterros sanitários e sistemas de logística reversa. O programa ReciclaGoiás, por exemplo, regulamentado em 2023, é um modelo estadual que incentiva a coleta seletiva e a reciclagem, servindo de inspiração para políticas nacionais.

Um Chamado à Ação
A audiência da CRE, com transmissão interativa, é um marco para alinhar o posicionamento do Brasil às metas globais. “Diante da tradição diplomática do país, é fundamental que o Brasil lidere pelo exemplo, promovendo inovações tecnológicas e políticas inclusivas,” destacou o senador Esperidião Amin.
O combate à poluição por plásticos exige colaboração entre governos, indústrias e sociedade civil. A transição para uma economia circular, apoiada por tecnologias sustentáveis, não apenas reduzirá os impactos ambientais, mas também gerará oportunidades econômicas, como novos empregos na cadeia de reciclagem e na produção de bioplásticos. Com o tratado global em fase final de negociação, o Brasil tem a chance de reforçar seu papel como líder ambiental, equilibrando desenvolvimento econômico e preservação para as gerações futuras.
Fonte: Agência Senado
Por Andre Estoduto – Redação Portal Guavira