Autoridades americanas pedem separação do Chrome e compartilhamento de dados de busca com concorrentes para restaurar competição no mercado digital
O Google voltou ao tribunal nesta segunda-feira (21) para a fase de definição das punições após ter sido condenado por monopólio no mercado de buscas online. Em uma audiência realizada na Justiça Federal em Washington, o Departamento de Justiça dos Estados Unidos propôs medidas drásticas para restaurar a competição no setor, incluindo a separação do navegador Chrome e a abertura dos dados de busca da empresa para concorrentes.
“Estamos aqui para restaurar a competição nesses mercados”, declarou David Dahlquist, advogado do Departamento de Justiça, durante a audiência. Segundo ele, as medidas corretivas são necessárias para “garantir que todos os rivais entrem em campo e que esse bloco de gelo descongele”, referindo-se ao que o órgão considera um ciclo de práticas anticompetitivas que permitiu à empresa dominar o setor.
O caso representa um dos maiores desafios antitruste enfrentados por uma empresa de tecnologia nas últimas décadas e pode redefinir o futuro do mercado digital. A decisão sobre as punições, esperada para agosto ou setembro deste ano, tem potencial para alterar significativamente a forma como os usuários acessam informações na internet e impactar o modelo de negócios de uma das maiores empresas de tecnologia do mundo.
Antecedentes do Caso
O processo antitruste contra o Google teve início em 2020, durante a administração Trump, quando o Departamento de Justiça dos EUA e 11 estados americanos apresentaram uma ação judicial acusando a empresa de manter um monopólio ilegal no mercado de buscas online. Em agosto do ano passado, o juiz Amit Mehta, do Tribunal Distrital de Columbia, emitiu uma decisão histórica, afirmando que a empresa abusou ilegalmente de seu poder de mercado para esmagar a concorrência, classificando explicitamente a atuação do Google como “monopolista”.
Na decisão, o magistrado concluiu que o Google implementou uma estratégia sistemática para manter sua posição dominante, principalmente através de acordos exclusivos com fabricantes de dispositivos móveis e navegadores, pagando bilhões de dólares anualmente para garantir que seu mecanismo de busca fosse a opção padrão em smartphones, tablets e computadores. Esses acordos, segundo o tribunal, criaram barreiras significativas para potenciais concorrentes.
Propostas do Departamento de Justiça
As medidas corretivas propostas pelo Departamento de Justiça dos EUA são abrangentes e visam desmantelar o que o órgão considera um ciclo de práticas anticompetitivas que se retroalimenta. Entre as principais propostas apresentadas na audiência desta segunda-feira estão:
- A venda forçada do navegador Chrome, que atualmente detém aproximadamente 65% do mercado global de navegadores e serve como uma importante porta de entrada para os serviços de busca do Google.
- A proibição de pagamentos a fabricantes de dispositivos móveis, como Apple e Samsung, para tornar o Google o buscador padrão nesses equipamentos, uma prática que custa à empresa bilhões de dólares anualmente.
- O compartilhamento de informações técnicas e dados de busca com concorrentes, permitindo que outras empresas desenvolvam serviços competitivos com acesso a recursos semelhantes.
- Caso não haja mudanças significativas no mercado de busca na internet dentro de cinco anos, o Google poderia ser obrigado a se desfazer de seu sistema operacional móvel, o Android, que equipa a maioria dos smartphones no mundo.
Segundo David Dahlquist, advogado do Departamento de Justiça, estas medidas são necessárias para “descongelar” um mercado que se tornou estagnado devido às práticas monopolistas do Google. “As medidas corretivas garantirão que todos os rivais entrem em campo”, afirmou durante a audiência.

Argumentos da Defesa
O Google, por sua vez, reagiu veementemente contra as propostas apresentadas pelo governo americano. John Schmidtlein, advogado da empresa, classificou as medidas como “extremas” e “fundamentalmente falhas”, argumentando que elas prejudicariam a inovação e os consumidores, em vez de promover a competição.
“O Google conquistou sua posição no mercado de maneira justa”, defendeu Schmidtlein, explicando que a empresa obteve sucesso ao realizar investimentos estratégicos que garantiram sua relevância na era da revolução móvel. Segundo ele, a superioridade da pesquisa do Google é resultado de trabalho árduo e inovação contínua, não de práticas anticompetitivas.
A defesa também argumentou que as medidas propostas apenas serviriam para beneficiar concorrentes com vantagens artificiais que não teriam sido conquistadas em um mercado competitivo. “Estas propostas não promovem a competição real, apenas redistribuem artificialmente o mercado”, afirmou o advogado da gigante de tecnologia.
Impactos Potenciais
As consequências deste caso podem ser profundas tanto para o Google quanto para o ecossistema digital como um todo. A venda forçada do Chrome, por exemplo, representaria uma das maiores reestruturações corporativas na história recente da tecnologia, comparável ao desmembramento da AT&T na década de 1980 ou ao caso antitruste da Microsoft nos anos 1990.
Para os consumidores, as mudanças poderiam alterar significativamente a forma como acessam informações online. Tradicionalmente, o mecanismo de busca do Google tem sido a principal porta de entrada à internet para bilhões de usuários. Caso o juiz decida pela imposição das mudanças, é possível que os usuários comecem a utilizar uma gama mais ampla de mecanismos de busca, navegadores e assistentes virtuais.
O caso também tem implicações para outros processos antitruste em andamento contra o Google. Recentemente, um juiz federal determinou que a empresa manipulou o mercado de ferramentas de publicidade utilizadas na web, caracterizando essa prática como monopólio. Além disso, um julgamento anterior concluiu que a loja de aplicativos do Google também operava como um monopólio ilegal.
Próximos Passos
O juiz Amit Mehta, que preside o julgamento, indicou que espera emitir uma decisão sobre as medidas corretivas propostas até agosto ou setembro deste ano. Até lá, ambas as partes continuarão apresentando argumentos e evidências para sustentar suas posições.
Independentemente do resultado, é quase certo que a parte perdedora recorrerá da decisão, potencialmente levando o caso até a Suprema Corte dos Estados Unidos. Isso significa que a resolução final pode levar ainda alguns anos, durante os quais o Google continuará operando sob escrutínio intensificado.
Especialistas em direito antitruste e tecnologia estão acompanhando atentamente o caso, considerando-o um marco que poderá estabelecer precedentes importantes para a regulação das grandes empresas de tecnologia no século XXI. “Este é um momento decisivo para determinar como as leis antitruste, criadas há mais de um século, serão aplicadas na era digital”, comentou Sarah Johnson, professora de direito da Universidade de Stanford, especializada em regulação tecnológica.
Conclusão
O embate entre o Departamento de Justiça dos Estados Unidos e o Google representa um ponto de inflexão na história da regulação das grandes empresas de tecnologia. As propostas apresentadas pelo governo americano — incluindo a separação do Chrome e a abertura dos dados de busca para concorrentes — são medidas sem precedentes na era digital, comparáveis apenas aos grandes casos antitruste do século passado.
A decisão que o juiz Amit Mehta tomará nos próximos meses poderá redefinir não apenas o futuro do Google, mas também estabelecer parâmetros para a aplicação das leis antitruste em um mundo cada vez mais dominado por gigantes tecnológicos. O equilíbrio entre promover a inovação e prevenir o abuso de poder de mercado está no centro deste debate.
Para os consumidores, o resultado deste processo pode significar mudanças substanciais na forma como interagem com a internet. A possibilidade de um ecossistema digital mais diversificado, com múltiplos mecanismos de busca competitivos, navegadores alternativos e novas opções de serviços online, dependerá diretamente das medidas que forem implementadas.
O caso também serve como um alerta para outras empresas dominantes no setor tecnológico, sinalizando que as autoridades antitruste estão dispostas a tomar medidas drásticas para garantir mercados competitivos, mesmo que isso signifique desmantelar partes de negócios consolidados.
Enquanto o Google defende que sua posição foi conquistada por mérito e inovação, o governo americano argumenta que práticas anticompetitivas sistemáticas sufocaram a concorrência por anos. O desfecho deste embate não apenas determinará o futuro de uma das maiores empresas do mundo, mas também poderá moldar a internet que conheceremos nas próximas décadas.
Por Andre Estoduto – Redação Portal Guavira