Os valores recebidos pela família da advogada Tonia Andrea Inocentini Galleti, assessora jurídica do Sindicato Nacional dos Aposentados, Pensionistas e Idosos (Sindnapi), foram os principais questionamentos feitos durante o depoimento dela à CPMI do INSS, na segunda-feira, 20/10. A CPMI do INSS esteve reunida até a madrugada desta terça-feira, 21. De acordo com o relator da comissão, deputado federal Alfredo Gaspar (União-AL), Tonia e seus familiares teriam recebido R$ 20 milhões em recursos oriundos do INSS, via sindicato.
A maior parte dos questionamentos abordou a atuação dela e de seus familiares no Sindnapi, sindicato que é acusado de ser uma das entidades responsáveis por descontos associativos cobrados diretamente na folha de aposentados sem a devida autorização. Além de atuar como advogada do sindicato, ela é filha de João Batista Inocentini, um dos fundadores do Sindnapi e presidente desse sindicato por muitos anos, até sua morte em 2021.
O Sindnapi tem como vice-presidente o irmão do presidente Lula, José Ferreira da Silva, o Frei Chico. Os governistas impediram que ele fosse convocado à CPMI do INSS. O ministro André Mendonça, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou o bloqueio de valores ligados ao Sindnapi que totalizam R$ 389 milhões.
Integrante da CPMI, a senadora Tereza Cristina (PP-MS), avaliou que a Comissão está evidenciando para o país o modus operandi de várias entidades suspeitas de descontos ilegais nas aposentadorias e pensões: a produção em massa de filiações, sem conhecimento dos aposentados, o recebimento de centenas de milhões de reais originários da folha do INSS e o repasse dos descontos fraudados para uma cadeia de empresas de familiares.
“É tudo igual, você muda o sindicato, mas é tudo igual: é a família inteira que trabalha, todo mundo recebe, quem paga o serviço recebe na outra empresa, na outra ponta, e é sócio da cunhada, do irmão”, resumiu a senadora.
Ela acrescentou que, para a população, “não importa se isso aconteceu no governo A, no governo B, no governo C”. “As pessoas querem é que as coisas sejam apuradas e venham as punições. A gente perde muito porque nós ficamos aí num jogo de acusação ( entre governo e oposição)”, alertou Tereza aos colegas parlamentares. “As acusações têm que vir depois dessas investigações, porque nós temos realmente um roubo enorme, uma fraude em cima dos aposentados do INSS desse país”, argumentou.
“Temos de trabalhar para aprofundar essa investigação, para saber como foi feito esse roubo, como é que ele aconteceu e esse assunto não pode morrer. A população brasileira espera respostas concretas e espera que também nós possamos ter um sistema aprimorado para não deixar que isso aconteça novamente”, afirmou Tereza.
“Agora, dizer que os aposentados estão recebendo nesse governo, me desculpem. Estão recebendo porque o Congresso denunciou e TCU cobrou, a CGU foi para cima, porque tem inquérito na Polícia Federal (PF). E esse dinheiro (do ressarcimento aos aposentados) é dinheiro nosso, é dinheiro da população. Não foi dinheiro tomado desses sindicatos que meteram a mão no salário de pessoas muito vulneráveis que deviam ser protegidas”, concluiu a senadora.
A depoente compareceu à comissão com habeas corpus concedido pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), que a dispensava de responder perguntas que pudessem incriminá-la. Mesmo assim, Tonia respondeu as questões, ainda que muitas vezes tenha dito desconhecer os fatos.
Ela afirmou que sua família recebeu esses valores em razão de serviços efetivamente prestados. Ela afirmou ainda ter 85 mil procurações em seu nome feitas pelos associados do sindicato. Ela não soube responder a pergunta da senadora Tereza Cristina que quis saber quantos advogados havia sob sua supervisão, responsável por responder a 17 mil processos judiciais. Também não explicou quais propostas apresentou, como integrante, no final de 2022, do núcleo de transição do governo petista, para melhorar o INSS.
Venda casada
Uma das investigações citadas na CPMI trata da venda casada de empréstimos por parte do banco BMG e filiações do Sindnapi. Há denúncias de que aposentados teriam sido filiados ao sindicato, sem ter conhecimento disso, após procurarem agências de correspondentes desse banco para a contratação de crédito consignado (com desconto na folha de pagamento do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS).
Ao responder a perguntas do relator, a depoente declarou que as filiações do Sindnapi estavam em queda entre 2016 e 2017, já que praticamente não havia novas associações e ainda havia perda pela morte de filiados. Foi então, contou ela, que surgiu a ideia de uma parceria entre o sindicato e a corretora CMG, ligada ao banco BMG.
Ainda segundo a depoente, a corretora teria solicitado a contratação de uma gestora para o projeto, e, como o sindicato não tinha funcionários suficientes para isso, foi criada a Gestora Eficiente, que tinha entre os sócios seu marido, Carlos Afonso Galetti Júnior. Uma outra empresa, a Essence, que prestava serviços para a gestora, era comandada pela mãe e pela irmã da depoente, Neuza Inocentini e Nita Gabriela, respectivamente.
O relator apontou que, até 2020, os descontos de associados vinham num parâmetro bastante similar. Após esse período, o número de filiados começou a crescer “em ritmo alucinado”, passando de 145 mil associados para 366 mil em 2023. Gaspar também lembrou que, de acordo com a Controladoria Geral da União (CGU), 92% dos filiados ao Sindnapi não reconheceram as filiações ao sindicato. Ela negou que as filiações fossem irregulares.
Conselho da Previdência
A depoente também respondeu questionamentos sobre os alertas sobre fraudes que ela teria feito quando era integrante do Conselho Nacional de Previdência Social (CNPS), já no governo Lula 3. Entre outras questões, Gaspar quis saber como Tonia teria percebido a possibilidade de fraudes e o que a teria levado a fazer esses alertas.
Ela afirmou que havia reclamações de alguns associados, que relatavam estar sendo abordados por outras entidades, e que outros associados, inclusive diretores, descobriam que não estavam mais associados ao Sindnapi. Ela atribuiu esse movimento a entidades fantasmas, criadas “na calada da noite” que ganhavam milhares de sócios de um mês para outro.
Sobre as denúncias que teriam sido feitas pela depoente ao Conselho Nacional da Previdência Social, Gaspar afirmou que parece incongruente o fato de a denunciante (Tonia) ser a mesma pessoa que depois foi alvo de medidas cumpridas pela Polícia Federal, devido à suspeita de que ela participaria de uma organização criminosa relacionada a descontos irregulares em aposentadorias e pensões.
“Eu tenho três hipóteses. A primeira hipótese é que a senhora [Tonia] é inocente no nome e no papel de coordenadora jurídica. A segunda hipótese é que essas associações fantasmas estavam passando a perna nas outras que já existiam e estavam criando um problema associativo, porque era uma verdadeira guerra associativa (…). A terceira hipótese é a de que foi feita a denúncia para encobrir os malfeitos que estavam ocorrendo no próprio Sindnapi”, disse o relator.
Amar Brasil
A CPMI convocou ainda para depor Felipe Macedo Gomes, que, apoiado por habeas corpus, nada respondeu à Comissão. Ex-presidente da Amar Brasil Clube de Benefícios (ABCB), Gomes é apontado pela PF e pela CGU como um dos operadores da fraude de descontos indevidos em benefícios previdenciários.
A entidade movimentou R$ 143 milhões entre 2022 e 2024 e, segundo as autoridades, 96,9% dos aposentados afirmaram não ter autorizado os débitos. Além da Amar Brasil, Felipe Macedo Gomes também estaria envolvido em outras entidades que são alvo de investigação: a Master Prev, a Associação Nacional de Defesa dos Direitos dos Aposentados e Pensionistas (Andiapp) e a Associação de Amparo Social ao Aposentado e Pensionista (Aasap).
Segundo o relator da CPMI, essas quatro associações, juntas, movimentaram ao menos R$ 700 milhões por meio de descontos indevidos aplicados a aposentados e pensionistas.O esquema também envolveria outros investigados: Américo Monte, Anderson Cordeiro e Igor Delecrode.
A Polícia Federal identificou uma frota milionária de carros de luxo registrada em nome dos quatro. Entre os veículos, estão uma Ferrari, cinco BMWs e 16 Porsches. Alfredo Gaspar apontou ainda o envolvimento de servidores de alto escalão do INSS, como André Fidelis, Virgílio Antônio e Jucimar Fonseca, que teriam facilitado o esquema das associações e autorizado os descontos fraudulentos.
Informações: Agência Senado
Redação Portal Guavira